terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Reflexões anônimas sobre o Cocan 2010






Recebi este belo texto por email do Kota Baião. Resolvi compartilhar com os leitores da Casa. Uma bela reflexão. O Brasil, que vai sediar a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016, vive o mesmo dilema: vestir-se de luxo, tendo antes de resolver problemas básicos, muitos dos mesmos do lado de lá e de cá.


Mama, será que estamos preparados para o CAN??


Mama, será que estamos mesmo preparados para essa grande festa que os meus irmãos mais velhos que te governam estão a organizar?? Será que ela é mesmo necessária??

Desculpa mama, mas não consigo reagir com entusiasmo a essa idéia, porque quando olho à minha volta, vejo que ainda temos muito que arrumar aqui em casa.

Não consigo parar de pensar que os meus irmãos gastaram tanto dinheiro a construir 4 estádios em tão pouco tempo e aquela universidade grande, com dormitórios e tudo, que eles nos prometeram (há quantos anos mesmo??) simplesmente ainda não acabou...

A quem queremos impressionar mãe? Talvez eu é que não esteja a perceber muito bem e por isso me questiono tanto... E se de facto queremos impressionar, não é melhor impressionarmos com idéias do que com “fintas”? Ou impressionar o mundo com aquela menina que cresceu em meio a tantas dificuldades mas que mesmo assim é uma estudante brilhante, do que com aquela que é especial só porque é bonita? Não é melhor impressionar com o que é inteligente do que com o que é bonito ou divertido? Afinal, qual é a nossa prioridade mama? Impressionar ou trabalhar?

Como é que achas nós, teus filhos menos favorecidos na distribuição do leite das tuas grandes e fartas “tetas” nos sentimos diante de um evento como esse, sabendo que tanta coisa podia ser feita não só com o dinheiro, mas com o tempo e com pessoas que se têm dedicado a esse evento de 10 dias de simples diversão?

Será que devemos mesmo estar entusiasmados, sorridentes e orgulhosos, quando simplesmente não temos qualidade de vida? Mama, posso garantir-te que nenhum dos teus filhos hoje tem qualidade de vida, nem mesmo aqueles à quem deste as rédeas da nossa casa, porque acredito que mesmo eles, que por trás dos muros têm o necessário e o desnecessário, não gozam da qualidade de vida que é proporcionada por uma consciência tranquila, pelo sentimento de dever cumprido, pela alegria no rosto dos que os rodeiam, isso para não mencionar, as longas horas no transito, as ruas esburacadas onde quer que se vá, a desorganização e a certeza de que por mais que se esforcem ou se esfolem a tentar mascarar a verdade o país está a piorar.

Como é que nós, teus filhos, vamos receber as visitas se, para as que aqui estão, olhamos com desconfiança porque a todo momento sentimo-nos ameaçados, tendo em conta que o Chinês, nos tira a oportunidade de aprender ofícios básicos como a pedreira e o Português, o Brasileiro e outros bem... esses simplesmente não nos dão oportunidade, porque trazem “tudo” de lá. Mas será que a culpa é deles? O correcto não seria eles virem por um período, aprendermos com eles e depois de bem aprendido fazermos nós próprios? Mas aqui nesta casa, quem está preocupado com o correcto se o incorrecto também funciona?

Mama, os lugares principais da nossa enorme casa, tal como ruas, praças e avenidas estão a ser bem arranjados, isso é importante porque impressionar implica, quase sempre tapar o sol com a peneira. Mas quase sempre eu me pergunto: e se por acaso o turista, ao sair do Aeroporto tiver que evitar a 21 de Janeiro e for forçado a passar pelo Cassenda, pelo Mártires do Quifangondo ou ainda pelo Cassequel, como é que vai ser? O que vai pensar de nós esse turista que vai assistir os jogos em estádios de dar inveja a países desenvolvidos de tão majestosos? Será que sentir-se-á impressionado?

Alguns filhos teus, podem dizer-me que não estamos a organizar o CAN para impressionar, mas sim para o nosso próprio beneficio. Garanto-te que quase no mesmo instante outros filhos teus, os irmãos que estão do meu lado, vão apresentar uma lista sem fim de ideias, eventos e instituições que precisam de ser organizadas para o nosso próprio benefício e que são tragicamente prioritárias.

Mama, sinceramente não quero odiar a ti, a nossa casa, ou aos meus irmãos a quem incumbiste a nobre tarefa de nos dirigir e não vou fazer mesmo porque não me cabe odiar pessoas mas sim condutas, mas digo-te, eu sou dos teus filhos mais pacíficos porque outros de tão descontentes, já falam do impensável, que é uma guerra civil. Já pensaste mama? Outra guerra entre nós? E essa talvez seria pior, porque os descontentes estão tão próximos dos “contentes” que se calhar nem precisem de se esforçar muito para vandalizar.

Ai mãe... Gostaria mesmo de estar saltitante de entusiasmo porque uma festa é sempre uma festa e quanto maior melhor, mas sinceramente estou ocupada a descobrir se o meu interesse pelos estudos é que está a diminuir ou se a instituição em que estudo é que está cada vez mais degradante!


Não sou contra o CAN, mas contra o facto de ter se tornado uma prioridade.

Autor desconhecido

05 de Outubro de 2009

2 comentários:

Menina de Angola disse...

realmente é muito triste ver o quanto está se gastando de dineheiro com o Can. Agora não se pode negar que há benefícios também. As obras na Rocha Pinto são uma realidade permanente e quem se beneficia delas são os moradores. E não venham com esse papo de que quem tem carro é estrangeiro pq não é verdade e além disso, quem anda de ônibus e candonga també utiliza a Rocha.

Vários hotéis estão sendo inaugurados o que gera emprego para o Angolano também.

Não estou defendendo a prioridade que deram para o Can, só estou dizendo que o Can trouxe benefícios para a população também...

Anônimo disse...

esse Kota Baião também!
Deixa lá o povo ser feliz, pá!
Só porque existe miséria já não podemos ser felizes?
O Kota Baião fez parte do governo angolano durante muito tempo, e também nesse tempo não houve melhoras para a população, né?
Não pode agora pedir que se faça em 2 ou 3 anos aquilo que não fizeram em 30 anos...
E o CAN, como disse a menina de Angola, trouxe sim benefícios. Vai dar emprego a mais angolanos. Pelo menos nos hoteis novos...mais vai dar emprego!
Como é então kota?
Saudações angolanas
Susana