sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

No tempo das rusgas (II)

Ladislau nasceu em 1970, na província do Zaire, mas os pais o enviaram cedo para Luanda, aos cuidados de um tio. Medo da guerra. O irmão mais velho de Ladislau foi incorporado ao exército em 1979. Seis meses depois, abalado pelos horrores do campo de batalha, desertou e se refugiou na França. Ladislau cresceu e, a partir dos 15 anos, começou a bater ponto nos quartéis das FAPLA:

- Eu era muito grande, aparentava mais idade. Sempre que passava uma patrulha da tropa, lá ia eu. Em todas as vezes tive sorte. O comandante de plantão, ao verificar meus documentos, mandava me soltar porque eu não tinha idade e estava na escola.

Aos 16 anos, o tio de Ladislau conseguiu um papel - falso - onde dizia que o garoto frequentava a escola militar. Isso ajudava na liberação. Ele calcula que, até os 17 anos, foi apanhado mais de 10 vezes.

- Quando cheguei aos 17, meu tio viu que não ia mais ter como resolver, porque eu ia completar a idade da tropa. Nesse meio tempo, meu irmão tinha cursado direito em França, já tinha condições, e decidiram me mandar para lá. Mas não era fácil. Eu tratei todos os papéis no consulado de França, mas não se podia simplesmente chegar ao aeroporto e embarcar. As autoridades veriam a minha idade e me proibiriam de entrar no avião.

O tio subornou algumas autoridades, Ladislau só foi para o aeroporto quando faltavam 15 minutos para o vôo partir. Entrou diretamente pela pista, sem passar pelos controles. Em outras palavras, fugiu do país.

Na França Ladislau viveu 20 anos. Lá se casou e teve duas filhas. Nesse tempo todo, nunca voltou a ver os pais. Em 2007 ele retornou a Angola por causa de um emprego. Só então voltou ao Zaire e reencontrou o pai, que era incapaz de reconhecer.

- Meu pai morreu duas semanas depois daquele encontro. Parecia até que só estava a esperar por isso.

Ladislau escapou de lutar, mas não das consequências da guerra. Foi criado longe dos pais, teve de se refugiar num país estranho e agora enfrenta de novo o drama de viver longe da família, no caso a esposa e as duas filhas francesas que não querem deixar o conforto de Paris para viver em Luanda.

2 comentários:

Anônimo disse...

Ditado Sul Africano:
"Africa ain´t for sissies"

Tenho dito!

jotaeme disse...

Boas! Angola é uma terra de infindáveis histórias de gentes que vã fazendo o seu futuro sem olhar para trás! Terra que calcorreei de Norte a Sul e aceita a sua dinâmica! Relatos de vida, "no doubt!".
Jorge madureira