Dezembro começou anunciando um frenesi silencioso em Luanda. Dezenas de pessoas estão fazendo as malas e voltando de vez para a terra natal ou tomando um avião para passar as festas de final de ano com os seus. “Quando você viaja?” ou “Vai passar o reveillón em Angola?” são as questões mais discutidas por esses dias em celulares ou MSNs da vida.
Quase todas as noites há uma festinha de despedida dessas pessoas. Tenho comparecido a algumas com um aperto no peito, pois uma rede sólida de amigos, geralmente criada com muito esforço em qualquer cidade do mundo, é um dos principais fatores para agoentarmos a saudade daqueles que deixamos longe. E, quando ela vai se desfazendo, parece que um punhado de areia se esvai pelos dedos abertos das nossas mãos.
Há um misto de felicidade e tristeza no olhar e semblante das pessoas que vão embora por esses dias.
Felicidade porque fecharam um ciclo da vida, concluíram um projeto que os trouxe para cá há dois ou três anos, juntaram algum dinheiro que pouco provavelmente ganhariam em outro lugar e vão poder, de novo, viver a sensação de estar em casa, com os seus, no seu país de origem, sem ter que ficar levando o passaporte para lá e para cá todos os dias - de todos, talvez o aborrecimento mais básico.
E tristeza, certamente em maior quantidade do que a felicidade, porque Angola vai estar para sempre no coração delas como uma experiência única, inesquecível e imensurável, pelo menos nessa altura da vida.
Os expatriados, em geral, chegam aqui com uma idéia equivocada de que são “consultores”, de que vão ensinar muita coisa aos angolanos, mas a verdade é que esse povo, desconfiado à primeira vista e simpático por natureza depois, é quem no ensina, todos os dias, à maneira dele, a “quebrar um concreto” que nem sabíamos existir nas nossas cabeças.
Fecham-se as malas, ficam de fora muitas vivências, amizades, “yá, tás fixe?”, amores, aventuras, choros, crises de depressão, lugares, pôres-do-sol, calor, cacimbo, novos desafios profissionais, medo do futuro e um consolo para todos: Angola, como experiência de vida e de trabalho, estará para sempre em nossos corações. E como um país onde muitos poderão muito bem viver para sempre, também.
Boa viagem para aqueles que voltam para casa!
PS: relendo este texto, passei a concordar com os amigos portugueses e angolanos que sempre nos dizem: brasileiro usa muito o gerúndio.
Mas o modo infinitivo dos verbos não foi feito para nós, definitivamente. Ficamos muito ridículos ao usá-lo ou tentar imitar quem o usa, combinado?
3 comentários:
X, vc não poderia expressar melhor esse sentimento de final de ano...
espero que ano que vem nos encontremos aqui de novo!!!
bj
Ciclos... com começo, meio e fim. Acreditar no fim? Jamais! Como vc descreveu, o fim na verdade é só o começo de um novo ciclo, agregado pelo conhecimento e aprendizado do que passou. Tristeza? Todas! Como um dos exemplos descritos, daqueles que estão a fazer as malas, vou embora e não imaginei que ficaria tão vulnerável. E isso só significa que, apesar de odiar carregar o passaporte para todos os cantos e tantas outras chatices, Angola ficará para sempre no meu coração. Adorei o post e, diferente da Menina de Angola, não te verei mais por aqui (ao menos por enquanto), mas não tenho dúvida que te reencontrarei lá em casa, para um café no nosso bairro... Abraços enormes,
é meninos, quando chega a hora de ir embora é uma chatice...
esta terra tem feitiço, tem água do Bengo, tem um quê que nos prende!
Para os que ficam connosco, boa continuação, para os que partem, felicidades.
kandandu a todos
Marinela
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