Um dia já escrevi sobre o Duck. Eu gostava daquele garoto. Era bem-humorado, com uma boca enorme e uns dentes brancos, brancos. A pele muito negra fazia crer que não era Angolano. Mas era. Angolano de Malanje. Um dos Portugueses que trabalhava com ele chamava-o de carvão. Ele respondia: diga, água de feijão… Água de feijão, contou-me ele, por ter a cara vermelha e, assemelhar-se à água do feijão vermelho cozido. Eu ria-me. Achava justo, a troca de apelidos. Dava para perceber que o Duck não gostava de ser tratado de carvão. Quase sempre, eu ouvia as suas conversas calada. Mas um dia, falavam sobre um filme Angolano e eu mostrei interesse pelo tema. Ficou prometido ele emprestar-me o filme dele, pirata como convém, para eu ver e se gostasse, ele comprava um para mim. Para mostrar aos amigos de Portugal, dizia ele. No dia seguinte, o filme estava comigo. Depois de o ver, ele perguntou-me se eu tinha gostado. Quando lhe disse que sim, ele respondeu: então fique com ele. E não aceitou o meu dinheiro. O Nando, um colega dele dizia: Eu já lhe tinha dito, o Angolano é rico sem dinheiro. E eu achei engraçada a expressão.
O Duck, era também o garoto que comprava o mata-bicho. Os outros começavam a trabalhar e ele, ia com o seu caderninho onde registava os pedidos, comprar o mata-bicho dos colegas. Era o shop boy, dizia o Nando. O mata-bicho nunca era igual. Sanduiche de frangalhada, bife com cebola, omolete. Quase sempre acompanhado por uma gasosa. Um dia pergunto-lhe: então conta lá Duck, o que vai ser o mata-bicho de hoje? Frangalhada - disse ele, acrescentando – quer ajudar? Confesso que não percebi logo. O Duck, estava disposto a partilhar a sua sanduíche de frangalhada comigo. Agradeci e confesso que fiquei feliz pelo gesto. Como dizia o Nando: O Angolano é rico sem dinheiro.
* O filme, levei-o para Portugal e vi com alguns amigos nas férias de fim-de-ano 2007/2008. Todos gostaram de ver e, segundo eles, poder ter alguém a explicar certas expressões usadas cá, era essencial. A língua é a mesma mas, nem sempre usamos as mesmas expressões.
* O filme, levei-o para Portugal e vi com alguns amigos nas férias de fim-de-ano 2007/2008. Todos gostaram de ver e, segundo eles, poder ter alguém a explicar certas expressões usadas cá, era essencial. A língua é a mesma mas, nem sempre usamos as mesmas expressões.
8 comentários:
Ol� Fernando! Tudo bem? Olha, sou colaboradora de uma revista brasileira de arte, cultura e tecnologia chamada Continuum. A cada m�s um tema � eleito. Esse m�s, por exemplo, trata do olhar. Uma das pr�ximas edi�es tratar� de migra�es, deslocamentos. Minha pauta � analisar isso pelo olhar de blogueiros pelo mundo. Ent�o gostaria de te entrevistar por e-mail, pode ser?
A revista � impressa e tem vers�o eletr�nica. Abaixo, o link dela e de uma das minhas reportagens:
http://www.itaucultural.org.br/index.cfm?cd_pagina=2689
http://www.itaucultural.org.br/index.cfm?cd_pagina=2720&cd_materia=579
caso esteja dispon�vel para dar uma entrevista por e-mail, me avise pelo verunschk@terra.com.br
Migas, querida, tuas histórias são, como sempre, sensacionais. Obrigado por compartilhá-las conosco nesta casa a cada dia mais animada! Bjs.
Daniela, estou aqui com os olhos alagados delagrimas de riso! Obrigada por me proporcionar esses momentos relaxantes com suas historias fantasticas. Voce tem talento pra cronista, vai guardando esses textos, hein? Quem sabe nao vira livro--que eu compraria pra mim e pra dar de presente!
Beijo grande,
Oi F. e Fer! Obrigada pelos carinhoso comentários. Não querendo tirar a poesia ao momento, confesso que isto é consequência de horas a mais fechada no carro. :o)
Beijão
Já estou com complexos de ser escritor( escrevinhador), você cada vez me impressiona mais, tem mesmo geito, gosto imenso de ler os seus "posts", apesar de às vezes se tornarem polémicos, mas ainda bem, dão luta. Continua Migas, estou contigo.Bjinhos de "amitié"
Fernando, muito obrigada também pelo comentário, sempre tão simpático! É muito engraçado "conhecermo-nos" através dos blogs e criarmos um carinho especial por certas pessoas, atrás dos nomes. O Fernando é uma delas, sem dúvida. E sabe porquê? Porque vê o seu país com olhos limpos. Critica onde tem que criticar e elogia onde tem de elogiar. Sabe o que é mesmo engraçado? É ler certos comentários nacionalistas, dizendo que Portugal, Angola ou o Brasil são os maiores. E depois, em alturas de crise (como a de agora em PT, por exemplo) talvez esses mesmos defensores da pátria sejam os primeiros a criticar o país, os políticos, os compatriotas. Enfim, eu não sou ferrenha pelo meu país. Tento vê-lo também com olhos limpos, tal como faço com Angola. Quem não gostar, pega no rato, botão lado esquerdo, canto superior direito do monitor, tem lá o X, e truflas, clica nele como se não houvesse amanhã. ahahahahah
Bom findi!
P.S. Pode tratar-me por "tu".
Bela história, belo exemplo. Um gesto simples pode significar uma verdadeira riqueza, a riqueza do espírito.
chr
Bela história mesmo. Peloe menos na minha experiência pessoal, a pessoas mais simples são as mais generosas dentro de suas possibilidades. Por exemplo, já estive em festas chiques e outras mais simples no Brasil. As mais simples eram as que me deixavam mais à vontade e eram as mais fartas, com certeza... Bjs, Paty.
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