quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Estamos juntos, ya?

Ya, estamos juntos. Mas não o suficiente para eu confiar nos vizinhos que habitam o mesmo prédio que eu e juntos cuidarmos da área comum do edifício.

Ya, estamos juntos, mas não a ponto de eu pensar no peão que tenta atravessar a estrada e parar para que ele possa cruzá-la, já que ninguém mais lhe dá passagem.

Ya, estamos juntos. Menos na hora em que eu trafego pelo acostamento para furar o congestionamento, cortando a frente de todos os meus irmãos que estão parados no trânsito.

Ya, estamos juntos, mas desculpa lá se eu estou com pressa e vou mesmo furar esta bicha, porque pouco me importo com as dez pessoas que nela estão também têm seus afazeres e compromissos.

Ya, estamos juntos, claro que estamos juntos. Por isso tenho certeza que você nem vai ligar se eu parquear a minha viatura na entrada da sua garagem e ignorá-lo quando você vier me pedir para tirá-la porque, afinal, não tenho mesmo onde parquear.

Ya estamos juntos, mas nem por isso vou deixar de lavar minhas latas e pincéis de tinta na cisterna de 10 mil litros em que você e a a sua família armazenam a água em que se banham, lavam roupas, loiças e usam para cozinhar...

Ya, estamos juntos, mas não me venha me pedir passagem no trânsito porque precisa mudar de faixa, ou porque vai entrar na próxima rua à direita, porque eu não vou mesmo deixá-lo entrar e se você insistir vamos colidir e aí eu parto a sua cara!

Ya, estamos juntos, sim. E já estou a chegar, eu sei que marquei consigo, estou no trânsito, estás a ver? Chego logo.

Ya, estamos juntos. Mas agora você já me pagou metade adiantado, vou chupar bué de biricocas e nunca mais apareço para continuar o serviço para o qual me contratou.

Ya, estamos juntos, amigo. Mas cada um por si. E a ganância e o egoísmo por todos.

11 comentários:

Mayra disse...

Triste, mas solidariedade não é mesmo o forte daqui. E a sensação de que isso é marcação homem-a-homem com você é eterna.
Força, coração peludo!

Anônimo disse...

F.,
Entendo tudo o que desabafou.
Mas se cada um de nós continuar a fazer tudo errado, ou se nos deixarmos contaminar e repetirmos os absurdos que vemos no dia-a-dia, então será melhor antecipar o retorno.
Força.
Afinal, estamos juntos, ya?
Diário da África

F. disse...

Obrigado Branquela e Diário. Claro que eu não vou repetir esses comportamentos, era só uma espetada nesse comportamento egoísta que tanto me incomoda.

Migas disse...

Eu entendo-te F. Eu também não repito as malabarices mas fico mal com a falta de civismo que vejo ao meu redor, directamente relacionado comigo ou não. Acho que falta "educação" porque no fundo, acho que qualquer reconhece o caos em que às vezes se vive cá. Não falo da educação da escola mas, o saber viver em sociedade. Seja angolano ou estrangeiro. Só que talvez, seja mais fácil continuar com as mesmas rotinas e o mesmo comportamento "salve-se quem puder". Mais uma vez, acredito que sejam "heranças" da guerra... E mais uma vez se repete: a solução é ter paciência!

O texto ficou incrivelmente expressivo! Gostei!

Abraço

Menina de Angola disse...

F. vc não imagina como esse texto caiu como uma luva hj... Dizem que o homem se adapta a tudo não é mesmo? Mas temos de tomar cuidado para não deixar que a falta de civismo mude quem somos. Um dia de cada vez é dando o exemplo sempre!

beijo grande e muita força!

Anônimo disse...

Falta de educação, civismo, pós guerra, etc.............sei não, acho que isso tudo é simplesmente FALTA DE AMOR.
chr

Anônimo disse...

Eu acho que é falta de tudo, como angolano sinto-me envergonhado.Levei os meus filhos mais pequenos a visitar Angola, na segunda-feira, o mais pequeno saiu com três. Fiquei mais uma vez apavorado com o trândito, a falta de civismo generalisada, voltei na terça à noite. A esperança é a última coisa a morrer, dizem, mas, aqui, a coisa está preta, a esperança está já moribunda.

m.Jo. disse...

F,
É muito triste ver a vida por esse prisma. Mas reparei que das 9 situações colocadas, 5 dizem respeito à educacão no trânsito. É o que está pegando mais, né?
Efeito Dorotéia?
Abraços e ... paciência

Anônimo disse...

Grande Post e excelente texto! Nada a acrescentar, está perfeito!

Anônimo disse...

Perfeito mesmo. Um desabafo e eu entendo. Não é problema exclusivo de Angola. Este problema das filas, em especial, me irrita muito e acontece direto por aqui. Bjs. Paty

Anônimo disse...

F. muito bom o texto, parabéns! Eu só posso testemunhar que o Angolano não era egoísta, nãoera orgulhosamente egoísta ... é, talvez a guerra e as dificuldades ... mas, ainda tenho esperança...e...Ya, tamos juntos!