segunda-feira, 17 de março de 2008

O Show de Truman

À distância, as centenas de prédios de quatro andares, todos bonitinhos, cercados por vastos gramados, lembram a paz dos subúrbios norte-americanos. Dá até para imaginar crianças felizes pedalando bicicletas nas ruas bem pavimentadas. Os prédios exibem portas de vidro na entrada, sem porteiros. As escadas são limpas e claras. Quatro apartamentos por andar, com três quartos, todos bem distribuídos e funcionais.

Depois do “Apocalipse Now” na Praça dos Congoleses, hoje fomos conhecer o “Show de Truman” do Projeto Nova Vida, uma área ao sul de Luanda onde o governo e as empreiteiras edificam, há anos, uma imensa cidade-dormitório.

Nasceu como um projeto de moradia para militares, mas já abriga gente de todas as profissões. Muitos brasileiros fogem para lá em busca de um mínimo de similaridade com os padrões de moradia a que estavam acostumados.

A ilusão de paz e tranqüilidade, porém, é barrada pelos grossos portões de ferro que protegem as portas dos apartamentos. Janelas e varandas também são gradeadas. Como nas prisões. Porque o condomínio não é murado, nem possui guaritas de controle de acesso.

Na área de serviço, a esperança de conforto se afoga nos tonéis de plástico usados para armazenar água – afinal, o abastecimento também é precário ali, como na cidade.

E o sonho de mundo perfeito acaba definitivamente quando o olhar do candidato a Truman bate contra o paredão de lixo no horizonte, a menos de um quilômetro. O projeto Nova Vida é vizinho do maior aterro sanitário de Luanda. Tem muito mais pernilongo e, portanto, maior incidência de malária.

Como está distante cerca de 20 quilômetros e todos que lá moram trabalham na cidade, as estradas ficam entupidas todos os dias nos horários de rush. E os moradores levam cerca de duas horas para chegar ao trabalho, e mais duas para voltar de casa.

Ou seja, a Nova Vida vem com todos os velhos problemas angolanos.

Um comentário:

Prof. Ramalho disse...

Difícil achar uma fórmula diferente para essa situação, mas esse segregação criada pela "ilha da fantasia", cobra seu preço: distância, trânsito, lixo, alvo fácil...Aqui também existem situações parecidas, com a diferença que não enfrentamos uma guerra. Nem por isso, conseguimos minimizar esse desequilíbrio tão acintoso nos lugares super povoados.