terça-feira, 29 de abril de 2008
Trouxa de roupa na cabeça
Pra quê? Virei atração na rua. Os homens troçavam de mim:
- Tá cansado o mundele? - e se riam, divertidos, até que uma mulher me parou:
- Moço, quem carrega coisas assim são as mulheres, tás a ver? Os homens usam mesmo os braços, que são fortes.
- Mas assim é melhor de carregar - respondi. - E ainda faz sombra pra esse sol quente.
Ela não se agüentava de rir:
- Ai é? Pois olha, vamos que eu lhe ajudo. Tire o fardo daí que estão todos a rir de si.
- Não faz mal. Onde está escrito que homem não pode carregar nada na cabeça?
- Tou a ver logo que és do Brasil, pois não? Baixe cá essa sacola e vamos juntos - divetia-se ela.
E caminhou comigo até a esquina da minha rua.
Terra de Barro Vermelho
Xamavu - Vem do kimbundu "ixi ya mavu" terra de barro vermelho, nome também dado antigamente ao mercado de S.Paulo, por estar situado em terra de barro vermelha.
Além das contribuições do Fernando, acrescento duas palavras que aprendi esta semana:
Cacimbo - É o inverno angolano. Como não chega a fazer tanto frio para que o chamem inverno, eles chamam de cacimbo.
Kwata-Kwata - Era o nome dado para as guerras entre os principados do reino do Congo antes da colonização portuguesa. Virou expressão de uso corrente e quando um angolano quer mandar o cachorro atacar alguém, por exemplo, diz ao cão: "kwata-kwata".
sábado, 26 de abril de 2008
Casa nova de novo
Desta vez, não temos vista na janela, como da última.
Alguns números para vocês entenderem o porquê de tanta provisoriedade:
- O preço médio do metro quadrado na cidade de Luanda está avaliado em US$ 7,5 mil, segundo alguns especialistas ouvidos por esta Casa.
- O primeiro condomínio construído pela Odebrecht em Luanda Sul, há 10 anos, foi lançado com casas de alto padrão vendidas a 700 mil dólares. Hoje, elas valem 4,5 milhões de dólares.
sexta-feira, 25 de abril de 2008
Grande dicionário Angolano (II)
A a D
E a L
M a Z
Como o dicionário não pode parar, seguem mais algumas palavras:
Apontar - Anotar, tomar nota.
Atribuído – Usado no sentido de aprovado, concedido. Quando você solicita um visto e ele é aprovado, por exemplo, dizem que ele foi atribuído.
Chave - Abridor de garrafas, também pode ser chamado de saca-rolhas, mesmo quando abre tampinhas.
Constrangimento – É usado no sentido de problema. Por exemplo, se você morar em Luanda Sul e tiver de trabalhar no centro, vais enfrentar muito constrangimento com o tráfego.
Partir – Quebrar. Usa-se inclusive para estradas danificadas pelas chuvas. "A estrada está partida". Aqui, quando alguém diz "A ponte que partiu", refere-se literalmente a uma ponte destruída pelas chuvas.
Romper – Também serve para quebrar, estragar. Quando alguém bate no seu carro, por exemplo, dizem que lhe romperam a viatura.
Viatura – Qualquer tipo de carro.
Para finalizar este post, outro dia perguntei o significado da palavra chamavo, mas me disseram que era língua Kioko. Se alguém souber, pode deixar um comentário.
quinta-feira, 24 de abril de 2008
Sete dias sem água
Dizem que a água está a voltar, está a voltar. Nossos reservartórios privados se esgotaram no banho de balde da manhã. Se esta noite não entrar, amanhã vou ter de dar uma chegadinha na praia da Ilha...
quarta-feira, 23 de abril de 2008
A riqueza de Cacuaco
Boa Esperança é pobre, não miserável. Tem lá seus problemas com violência, mas nem chega perto das periferias das grandes cidades brasileiras. O maior drama é mesmo a chuva. Ela transforma o chão em lama e os seus 50 mil moradores saem de casa descalços. De sapato, ninguém pára em pé.
Pode faltar dinheiro em Boa Esperança, mas não falta riqueza. É justamente o seu maior tesouro que o projeto de prevenção e combate à malária tenta proteger: as crianças. A espontaneidade e a alegria no olhar delas chama atenção através das lentes.
Elas se divertem com tudo. Com a cobra que acabaram de matar, com o “pula” atrás da câmera que nunca viram, e escancaram-se em sorrisos generosos, para que todos vocês possam experimentar um pouco dessa alegria sincera.
Mas nem todas as crianças que encontrei lá estavam felizes.
O Domingos, por exemplo, não estava sorrindo. Ele tem 5 anos e perde peso inexplicavelmente há um mês. Ninguém consegue saber o que ele tem. Estava na fila com a mãe, Francisca, para passar por um médico do Centro de Saúde.
terça-feira, 22 de abril de 2008
Grande dicionário Angolano
Jindungo ou Jindungu - Picante, fruto do jindungueiro. Deriva de seu nome o verbo ajindugar, que significa condimentar com jindungu. O jindungu pode ser de dois tipos:Kahombo ou kaleketa. O Kahombo, arredondado, é bastante saboroso. O Kaleketa, alongado, é bastante picante. "Jindungu no rabo do outro, é refresco" costuma dizer o povo, quando está zangado.
domingo, 20 de abril de 2008
Pra não dizer que não falei das flores

Mas chega também com a força e o colorido das flores. As flores que nascem ousadas atrás da poeira, ao lado do lixo e do esgoto, e dão vida às ruas com suas roupas estampadas. Carregam sobre a cabeça grandes pétalas de plástico recheadas de frutas. Não se curvam sob o sol ardente, não esperam acontecer. Seguem “caminhando e cantando”, (e os brasileiros sabem o que estou cantando...).
Arranjam-se em pequenos buquês nas esquinas, ensinando à Luanda o espírito de iniciativa e coletividade de que ela tanto necessita. Logo nas primeiras semanas vi um desses buquês em ciranda, com flores ensinando outras flores a ler e escrever. “Aprendendo e ensinando uma nova lição”. Lição que, espero, sigam ensinando aos irmãos que, equivocados, insistem que sábio é esperar.
Vim para Angola regar flores. E faço delas meu mais forte refrão.
Porque hoje é domingo...
E porque hoje é aniversário do meu pai, lá do outro lado do Atlântico.
Resolvi fazer um bolo. Mas não um qualquer. Uma receita que representasse um pouco do cadinho cultural desta Luanda cheia de expatriados.
Então fiz este “Pan de Plátano”, uma receita de origem mexicana, ensinada por uma cubana, feita por um brasileiro.

Pan de Plátano da Tereza
Ingredientes
5 ovos
6 bananas amassadas
2 medidas de farinha (latas de leite condesado)
1 medida de açúcar
1 xícara de óleo
1 colher de chá de fermento
1 pitada de sal
Preparo
Amasse as bananas e reserve. Em outra tigela junte a farinha, o açúcar, o fermento e o sal e misture bem. Adicione o óleo, misture bem e reserve.
Bata os ovos inteiros até que formem uma mistura homogênea. Em seguida, junte-os à farinha e misture bem. Acrescente a banana e misture até formar uma massa homogênea.
Deixe descansar por 5 minutos.
Unte a fôrma com um pouco de manteiga derretida e uma fina camada de farinha.
Pré-aqueça o forno por 5 minutos a 180C.
Coloque a massa na forma e leve ao forno a 180C, por 20 a 25 minutos.
Após 20 minutos, espete a massa com uma faca. Se sair seca, o Pão de Banana está pronto.
sexta-feira, 18 de abril de 2008
Pequeno Dicionário Angolano (III)
Estas duas que seguem já lá estão e são mesmo por minha conta:
Alcatrão – O asfalto das estradas;
Berma – A beira das estradas, no Brasil é chamado de acostamento.
quinta-feira, 17 de abril de 2008
Carta aberta a um anônimo
Caro anônimo,
Lamento que te tenhas ofendido. Ao que me parece, não compreendestes bem o intuito deste sítio. Claramente, como o entenderam os outros leitores, inclusive os angolanos, não é o de atacar ou desmerecer o país. É antes o de mostrar uma realidade que está escondida, fora da mídia, e que pelo tamanho e riqueza de Angola, não deveria continuar a existir.
Tu deverias antes indignar-te com a existência dos problemas aqui mostrados e não com quem os mostra.
Ou achas natural que 70% da população do teu país viva abaixo da linha miséria (dados do PNUD) para que outros 30% dirijam os jipes mais caros do mundo pelas ruas? Achas mesmo bom que tanta gente, em pleno século 21, viva sem energia elétrica, sem saneamento básico, sem coleta de lixo e sem água tratada?
Nunca me esquivei de mostrar os problemas do Brasil quando lá vivia, em outro blog semelhante. E se hoje cá vivo, quero fazer parte, ainda que de forma tímida, do esforço para melhorar as condições de vida de todos os angolanos – não apenas dos poderosos. Na minha opinião, o fato de não ter cá nascido não me tira esse direito.
O primeiro passo para resolver problemas, meu caro anônimo, é admiti-los. Fingir que eles não existem é perpetuá-los.
quarta-feira, 16 de abril de 2008
Pequeno Dicionário Angolano (II)
O Rodrigo, que cá está a viver desde julho de 2007, deixou um comentário com 24 termos de uso corrente. Clique aqui para conferir.
A palavra que segue nos foi ensinada pela nossa leitora Flávia, antiga colaboradora deste sítio.
Pica - Flávia estranhou na primeira vez em que viu uma criança apavorada dizendo: "A pica não, mãe, a pica não!" Pica, em português de Angola, é injeção, vacina, ou qualquer tipo de exame que exija o uso de agulhas. Quando você suspeita que contraiu malária, por exemplo, toma a pica. E ainda paga cerca de 8 dólares para isso numa boa clínica privada.
terça-feira, 15 de abril de 2008
Algumas palavras

O governo finge que está tudo bem, afinal, quem joga esse lixo todo nas ruas e entope os esgotos é o povo.
Os ambulantes fingem que está tudo bem, pois dali tiram seu sustento em notas amarrotadas de kwanzas.
Os milhares de compradores fingem que está tudo bem, basta enfiar os pés em sacolas plásticas e prender a respiração para pagar os preços mais baratos da cidade.
E as senhoras seguem fritando coxas de frango em panelas aquecidas por carvão a poucos centímetros do lixo; os adolescentes oferecem livremente bugigangas eletrônicas feitas por trabalhadores escravos na China; os negociantes vietnamitas vendem cama, mesa e banho nos armazéns por um terço do que se cobra nas lojas da cidade.
O sol torra as cabeças, o fedor aumenta, as crianças enchem as barrigas de vermes em mais um dia no meio do lodo, do esgoto e do lixo que a natureza nem sabe se um dia vai decompor.
Mas tudo está bem. No final do dia, algumas cervejas abertas e algumas lingüiças no churrasquinho bastam para estampar sorrisos banguelas nas caras sujas.
Alguns goles depois, todos já terão esquecido a miséria desgraçada em que vivem no país do petróleo e dos diamantes.
domingo, 13 de abril de 2008
Faltam palavras
Voltei pra casa querendo escrever sobre tudo aquilo. Mas como? Se fosse há 20 anos, escreveria um poema cheio de adjetivos. Há 15 anos, provavelmente comporia uma música estilo "we are the world" e mandaria por correio para a sede das Nações Unidas (hehehe...). Há 10, sairia com um manifesto pseudo-revolucionário e espalharia pela faculdade. Há 5, produziria uma reportagem cheia de números e aspas.
Mas hoje as palavras me faltaram. Pareciam todas ocas, sem força, sem cheiro. Tentei fazê-las pisar aquele esgoto, apertar-se naquela multidão, refletir os olhos amarelados daquela gente. Não deu.
Para quem vive aqui, uma sugestão: uma manhã no mercado de São Paulo é uma aula sobre este país (e sobre a humanidade!), uma pontada no coração, e uma saudável chacoalhada no espírito. Mas saia da rua principal, vista um plástico nos pés e entre pelas travessas cobertas de lixo.
Para quem está longe, deixo algumas imagens para ilustrar um pouco (ainda que bem pouco...) este mundo do absurdo.






sábado, 12 de abril de 2008
Luanda dos angolanos
Luanda virou uma loucura nos três meses anteriores à independência, que tinha data marcada para acontecer. Faltava comida e água, sobravam portugueses em imensas filas nos bancos, tentando sacar os escudos antes de partir.
Nos jardins das vivendas, as famílias construíram grandes caixas de madeira e empacotaram suas casas. O jornalista polonês Ryzsard Kapuscinski estava aqui na época. No seu livro “Another Day of Life”, ele descreve muito bem essa transferência da cidade de concreto para a de madeira.
No início de outubro, a Luanda encaixotada partiu numa longa fila de navios para Lisboa, Rio de Janeiro e Cidade do Cabo.
Despachadas as riquezas, seus donos iam para o aeroporto, que virou um campo de refugiados, desesperados por um vôo. Tinha gente dormindo na chuva do lado de fora do saguão, cada avião era disputado a tapas e outros países acabaram ajudando na criação de uma ponte aérea entre África e Europa.
Todos abandonaram a cidade. Da noite para o dia, Luanda não tinha mais médicos, nem carteiros, nem bombeiros, nem policiais... Nem lixeiros!
Os detritos acumulados nas ruas e esquinas, expostos ao calor intenso, começaram a transformar a Cidade Maravilhosa de África num lugar pestilento.
Apesar de tudo isso, havia um motivo para celebrar: pela primeira vez em 400 anos Luanda, enfim, era dos angolanos.
sexta-feira, 11 de abril de 2008
Pequeno dicionário Angolano
- Você sabe, falamos línguas diferentes aqui e no Brasil. Nós entendemos porque o som é parecido, mas a língua é outra.
Cheguei à conclusão de que ele tem razão. Por isso estou criando este pequeno dicionário, que começa com um termo bem curioso:
Mata-bicho – termo angolano para o pequeno-almoço português, nosso popular café da manhã. Com o uso, virou verbo. Ninguém está a lhe oferecer um inseticida se lhe pergunta: “Já mata-bichastes hoje?” Provavelmente vai convidá-lo para o café da manhã.
quinta-feira, 10 de abril de 2008
Você conhece a poesia de Agostinho Neto?
Imediatamente, vários escritores e intelectuais saíram em defesa das veleidades literárias do líder histórico do MPLA. E Agualusa vem sofrendo, desde então, um ataque feroz. A notícia mais recente, de hoje, diz que ele será processado judicialmente pela declaração. Prova de que Angola ainda não está tão aberta a opiniões divergentes das dos governantes.
Este vídeo, que encontrei no YouTube, mostra um dos poemas de Agostinho Neto. Ele foi postado por Kuribeka, que tem outros vídeos muito interessantes sobre fatos históricos de Angola, para quem se interessar.
quarta-feira, 9 de abril de 2008
Lembra que Luanda tinha muita poeira?
Quem só anda a pé, como eu, nem precisa se preocupar em malhar. Além do exercício da caminhada, é um tal de pular poça de barro pra cá e pra lá... Com o peso extra de terra grudada nas solas dos sapados, as pernas engrossam rapidinho.
terça-feira, 8 de abril de 2008
Um mês em Angola
- No final do primeiro dia, você acha que não vai aguentar uma semana;
- No final da primeira semana, você tem certeza de que não dura um mês;
- No fim do primeiro mês, bom, você já está achando que um ano talvez seja pouco...
domingo, 6 de abril de 2008
Rio de Janeiro de África

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sábado, 5 de abril de 2008
A tragédia do DNIC

Hoje faz uma semana que em Luanda só se fala no desabamento do prédio da Direção Nacional de Investigação Criminal (DNIC) da polícia angolana. Foi uma tragédia. Mais de 150 feridos e 30 mortos, na última contagem oficial.
O prédio, situado no bairro da Cidadela (não muito longe daqui), começou a ruir por volta de 1h30 de sábado passado, dia 29 de março. Às 4h30 foi tudo abaixo. A construção servia como detenção para suspeitos de crimes que ainda estavam a ser investigados. Entre os mortos, um bebê que nascera na cela da ala feminina e sua mãe. Um horror.
Em virtude da tragéda, a Defesa Civil de Luanda saiu às ruas tentando identificar outros prédios em risco de desabamento. Listou mais três, um deles bem na esquina do Largo do Kinaxixe, uma das regiões mais centrais da cidade.
Particularmente, acho que eles não procuraram direito. Diante do estado de abandono da maioria dos edifícios da cidade, não me espantaria se descobrissem que as estruturas de vários deles estão comprometidas.
sexta-feira, 4 de abril de 2008
O dia da paz
O conflito em Angola foi um dos mais emblemáticos da Guerra Fria, e foi marcado pela insanidade, pela sede de poder e pelo ideologismo interesseiro típico desse período. “Veste minha camisa que te dou um fuzil” (e depois levo suas riquezas...).
Soviéticos e cubanos sustentavam o MPLA; EUA e Israel garantiam as armas da FNLA; EUA (de novo!) e África do Sul patrocinavam a UNITA.
No fundo, uma confusão despropositada de siglas sem sentido para a maioria dos angolanos, mas que rapidamente fez a cabeça deles, separando irmãos e vizinhos em inimigos e uma nação novinha em folha numa filial do caos.
Para conhecer os detalhes da guerra, leia os 3 post abaixo, fruto de pesquisa feita por F. e sua veia de historiador, que vem aflorando aqui na África...
Dia da Paz - Parte 1: Sopa de siglas
Ao norte, Holden Roberto fundou a Frente Nacional de Libertação de Angola, FNLA, em 1961. Defendia a supremacia de seu grupo étnico, os Bakongo.
Mais ou menos na mesma época, estudantes angolanos no exílio, principalmente em Portugal, fundaram o Movimento Popular de Libertação de Angola, o MPLA, liderados por Antônio Agostinho Neto e Viriato da Cruz. Embora tivesse maioria da etnia Kimbundo, era o mais universalista nessa questão, com uma visão de Angola como uma nação única.
O MPLA tinha inclinações marxistas, era financiado pela extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, com apoio de Cuba, o que o impediu de conciliar-se com a FNLA, financiada pelos Estados Unidos e por Israel, além do Zaire.
Em 1966, dissidentes da FNLA fundaram a Unita, União Nacional pela Independência Total de Angola, liderada por Jonas Savimbi. Diziam-se maoístas, depois marxista-leninistas, mas acabaram entrando na guerra civil financiados pelos Estados Unidos e pela África do Sul. Savimbi era Umbundo e também tinha inclinações racistas contra as outras etnias.
Dia da Paz - Parte 2: Independência e morte
O MPLA dominava a região de Luanda, Benguela e o Lobito. Para tentar evitar que esse movimento tomasse o poder, a FNLA – apoiada pelas tropas do Zaire - invadiu Angola pelo norte em julho de 1975. A África do Sul invadiu o sul do país com suas tropas para apoiar Savimbi em agosto e o MPLA recebeu reforços cubanos em outubro.
No dia 11 de novembro de 1975, Agostinho Neto declarou a independência e se auto-proclamou primeiro presidente de Angola. O MPLA chegava ao poder, mas a guerra continuava comendo solta.
Em 1976, a FNLA foi derrotado e Holden Roberto fugiu para o Zaire. A luta continuou contra Savimbi. A Unita e a África do Sul sofreriam sua grande derrota em 1988, na batalha do Cuito Cuanavale, onde o MPLA e os cubanos os expulsaram do país. A guerra perdeu força, mas não terminou.
Dia da Paz - Parte 3: A paz, aos trancos e barrancos
Em 1992, foram marcadas eleições livres. Holden Roberto recebeu apenas 2,1% dos votos, retirou-se de cena e viveu em Luanda até morrer, no ano passado. Jonas Savimbi ficou com 40,07%. E José Eduardo dos Santos, sucessor de Agostinho Neto (que morreu em 1979), foi reeleito com 49,57% dos votos.
Savimbi não aceitou o resultado e retomou a guerra civil. Outros tratados de paz foram tentados e quebrados sucessivamente, até que as Forças Armadas Angolanas mataram o líder da Unita, em fevereiro de 2002.
Em 4 de abril do mesmo ano, foi assinada a paz. José Eduardo dos Santos continua no poder até hoje. A Unita se tornou um partido político e ganhou alguns ministérios no governo. Foram marcadas novas eleições parlamentares para setembro e, no ano que vem, as presidenciais. Dizem que o presidente não vai concorrer.
Mas isso, só o futuro dirá.
quinta-feira, 3 de abril de 2008
As vítimas silenciosas



Essas histórias ilustram a pior face do conflito civil que destruiu Angola entre 1975 e 2002. Como me disse uma das 18 mulheres mutiladas com quem conversei, elas não pegaram em armas, não lutaram por nenhum dos lados. Aquela guerra não lhes pertencia. Mesmo assim, tiveram suas vidas definitivamente marcadas pela brutalidade.
As 18 sobreviventes tiveram a coragem de participar de um concurso de Miss organizado pelo governo de Angola, o Miss Sobrevivente de Minas, para chamar a atenção do mundo para o problema. Afinal, ainda existem 2,3 milhões de angolanos vivendo em áreas de risco. Angola ainda tem, já mapeados, 3,2 mil campos minados.
Os mais otimistas dizem que ainda vai levar 30 anos para livrar o país dessa desgraça; os pessimistas apostam em 130 anos.
Para quem mora no Brasil, parece que o Estadão publicou hoje uma matéria sobre o concurso de miss. Mas o cara que escreveu lá não contou tantas histórias de sobreviventes.
O primeiro pedido de gasosa
– Senhor, identifique-se por favor – disse o policial. Saquei minha identidade diplomática e entreguei a ele.
– Ministério das Relações Exteriores? Protocolo Geral? Onde o senhor trabalha?
– Nas Nações Unidas – menti.
– O que é PNUD? Algum partido político?
– Não, é o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
– Ah, o senhor está a ajudar Angola?
– Exatamente.
– Para onde estás indo agora?
– Para uma reunião ali noutro bairro.
– Pois vamos então. O senhor sabe, existem muitos ladrões por aqui. Não como no Brasil, mas há gatunos. O melhor seria fazer uma fotocópia deste bilhete de identidade e deixá-lo em casa. Pode andar só com a cópia.
– Agradeço o conselho, vou segui-lo.
Chegamos à esquina. Ele parou.
– Nosso papel, como policial, é proteger e ser amigo do cidadão. Apreciei muito tê-lo conhecido. O senhor não teria uma gasosa para me oferecer?
– Também apreciei muito tê-lo conhecido, mas não tenho gasosa.
– Mas eu o acompanhei até aqui. E a segurança que lhe prestei?
– Agradeço sua preocupação com minha segurança, mas não pedi que o senhor me acompanhasse.
– Está bem então. Vá em segurança. Quem sabe numa próxima vez que o senhor passe por aqui...
terça-feira, 1 de abril de 2008
Tesouro escondido

O muro branco que fazia as vezes de tela está sujo, mal-cuidado como quase tudo por aqui. Faz muito tempo que não vê uma película. Do espaço, projetado pelo arquiteto português João Garcia de Castilho nos anos 50, sobraram os traços de pompa.
Deviam ser realmente magníficas as noites de cinema ao ar livre, com a baía de Luanda iluminada por navios na entrada do porto. Hoje o espaço só recebe eventos e espetáculos. Por isso as cadeiras alinhadas.