Poucos lugares me impressionaram tanto na vida quanto as ruas de São Paulo, o bairro dos camelódromos e armazéns aqui de Luanda. Ali, cada detalhe me remete ao caos. O cenário, os cheiros, as atitudes, os barulhos, os rostos. E o lixo, o lixo, o lixo...
Voltei pra casa querendo escrever sobre tudo aquilo. Mas como? Se fosse há 20 anos, escreveria um poema cheio de adjetivos. Há 15 anos, provavelmente comporia uma música estilo "we are the world" e mandaria por correio para a sede das Nações Unidas (hehehe...). Há 10, sairia com um manifesto pseudo-revolucionário e espalharia pela faculdade. Há 5, produziria uma reportagem cheia de números e aspas.
Mas hoje as palavras me faltaram. Pareciam todas ocas, sem força, sem cheiro. Tentei fazê-las pisar aquele esgoto, apertar-se naquela multidão, refletir os olhos amarelados daquela gente. Não deu.
Para quem vive aqui, uma sugestão: uma manhã no mercado de São Paulo é uma aula sobre este país (e sobre a humanidade!), uma pontada no coração, e uma saudável chacoalhada no espírito. Mas saia da rua principal, vista um plástico nos pés e entre pelas travessas cobertas de lixo.
Para quem está longe, deixo algumas imagens para ilustrar um pouco (ainda que bem pouco...) este mundo do absurdo.
Nosso agradecimento à doce e sorridente Anabela, que nos acolheu na sua barraca de sandálias de plástico para tirar essas fotos escondidas.
Uma bailarina de peso
Há 5 dias
11 comentários:
Nossa! P., esta doeu fundo. Nao precisa escrever mais nada. As imagens ja disseram tudo. Lembrei dos lixoes do Rio de Janeiro, quando eu via aquelas fotos de criancas tentando arrumar o sustento da familia no meio daquelas condicoes desumanas...
E triste ver imagens como estas, mas por outro lado, nos faz pensar o quanto somos felizes por nossa vida ser diferente desta outra realidade.
Tenho lido o que vocês escrevem todos os dias sobre Luanda e não tenho palavras para descrever o que sinto por esse povo sofrido que, apesar de tudo, ainda sai nas
fotos sorrindo.
Bjs,
Bia
F. que esse trabalho seu sirva para causar indignação. Pelo que vemos nesta postagem, pelo que imaginamos que existe em outros rincões do planteta, pelas nossas favelas brasileiras, que tudo possa causar desconforto nas consciências. Se não for pela experiência alheia, será pela própria dor que o planeta imporá. Restarão Seres de consciência limpa e plena que resgatarão a razão de ser da espécie humana.
CHR
Nancy, Bia e CHR: obrigada pelas mensagens, mas dessa vez o post é da P.... (risos)
Tenho lido o que escrevem sobre Luanda, estas fotos dispensam comentários. Fiz um link lá no meu silêncio para este post, espero que não se importem. Beijú.
Olá Kianda, muito obrigado pelo link e por nos prestigiar. Também tenho lido o seu silêncio e já fiz link para ele aqui na casa.
Oi Paty e todos,
O pior é que, apesar de parecer, isso não é um lixão...
É uma rua comum num dos mais populares bairros de compras de Luanda, por onde passam diariamente milhares de pessoas. Quer dizer, elas na verdade se espremem pelos cantos, porque a rua mesmo está tomada por lixo, como você vê.
P.
Mais uma vez a P. soube escolher as palavras certas (por mais ocas que estivessem) para expressar seus sentimentos.
Desde as primeiras linhas percebi que o post era dela - estilo inconfundível.
E eu achava q o subúrbio de São Paulo é q era desorganizado e sujo...
abs.
Conheço bem esse mercado e todos os seus dramas diários, tal como conheço outros mercados e zonas de Luanda que se batem com problemas da mesma ordem. Agora, aqui de longe, sinto apesar de tudo saudades. Saudades fundamentalmente daquele sorriso amigo que surgia no mais inesperado personagem. Com todos os seus problemas sinto saudades de Luanda.
Um kandandu.
Postar um comentário